APENAS UM APELO, SENHOR PRESIDENTE...!

(Discurso à Nação de 2019)
O discurso à Nação trouxe o relatório da Governação e o pensamento sobre a Nação do Presidente da República. Exaustivo como qualquer relatório, com pormenores contabilisticos e estatisticos em muitos casos que ajudaram-nos a atravessar a floresta de departamentos governamentais que fazem do aparelho do Estado um menino obeso e desajeitado.
Admita-se que JLO trouxe novidades interessantes que fazem nascer a ideia de protecção social em Angola: (1) subsidio para os transportes públicos e (2) para maternidade (9 mil kwanzas para mães com 3 filhos). Foram, para mim, os momentos mais altos do discurso-relatório do Presidente da República, isso sem esquecer a ideia "apetitosa" das bolsas de estudos para licenciados e mestres nas melhores universidades do mundo. Fantástico!
O meu amigo Mfuka Muzemba que no início do milénio encabeçou um grupo de estudantes do ensino médio para manifestar-se a favor do passe social para facilitar os estudantes na utilização dos transportes públicos deve ter ganho uma sensação de alívio!
É claro que nem tudo está já em fase de execução, mas a pura intenção já faz mereceres as minhas palmas Sr. Presidente!
Mas durante o discurso-relatório, JLO não pôde evitar “desmarcar-se” como um ferrenho defensor de politicas de esquerda marcadas pelas ideias de centralização da economia, do controlo das liberdades, do desprezo total da participação dos particulares (indivíduos e empresas) nos esforços do desenvolvimento nacional, trazendo a cartilha da “revolução agrária” do tipo Maoista que reduz os angolanos num “grupelho” de esfomeados a quem o Estado vai alimentar através da produção interna conduzida pelo PRODESI em doses mal quantificadas no tempo. Isso foi enfatizado com as palavras finais “o apressado come cru!” como quem diz: "controlem a vossa fome e tenham paciência que o Estado vai dar tudo o que precisam!" Que ousadia, Sr. Presidente!
Fiquei estarrecido de espanto quando percebi que a visão de desenvolvimento empresarial de JLO reduz-se ao trabalho no campo. Daí o PRODESI seleccionar produtos agrários, daí os créditos bancários beneficiarem apenas os agricultores, daí os bancos serem obrigados a financiar a economia com 2% dos seus activos para alavancar a produção dos camponeses, daí o apoio aos camponeses com brigadas de mecanização agrícola e engenharia rural, etc, etc
Nem uma palavra de conforto aos comerciantes, aos prestadores de serviços, aos bancários, aos operadores de mercados financeiros, aos industriais, aos artistas, aos artesãos...Todo o apoio a economia reduz-se a produção agrária e pesqueira? É essa a ideia de transformação económica que apresenta aos angolanos? Onde ficam os jovens que sonham em criar grandes negócios com as “startups”? As zungueiras e os vendedores ambulantes, os técnicos e profissionais autónomos, os empreendedores, os empresários e investidores das zonas urbanas? Nada? Que pelo menos fossem estimulados com incentivos e facilidades na criação dos seus negócios e realização dos seus investimentos. Mas nem mesmo isso se ouviu do Sr. Presidente. Que pena!
Saiba que depois dos camponeses produzirem faltará o fabricante de embalagens, as transportadoras, os construtores de estradas, os comerciantes e todos outros agentes económicos que não estão previstos no seu programa de apoio a economia para que os produtos agrícolas cheguem a nossa mesa e se realize o seu sonho da autossuficiência alimentar e do fim das importações. Depois não meta as mãos a cabeça por ter esquecido (ou não ter sabido) que a economia funciona como um todo e com a participação de todos.
Mas como pode pensar que toda a economia e as relações de produção sejam reduzidas a agricultura? Que apenas essa área, e poucas outras como as florestas e as pescas, mereçam o foco da sua governação económica? Não percebe que está a “ruralizar” a economia nacional vendo em todos angolanos potenciais trabalhadores braçais envolvidos num voluntariado nacional dirigidos ao campo?
É evidente que não é novidade nenhuma. Agostinho Neto teve essas lucubrações no seu breve mandato, quando no final dos anos 70, lançou a sua “revolução agrária” pensando que se alavancasse a produção agrária toda a economia floresceria. Então esqueceu de tratar das fábricas e do sector dos serviços e tudo morreu poucos anos depois. Julius Nyerere, na Tânzania, esteve tão obcecado com a sua “revolução agrária” que forçou as populações das cidades a mudarem-se para as aldeias porque entendeu transformar o país numa autêntica lavra onde todos deviam cultivar para sobreviverem criando a ilusão da autossuficiência alimentar e do fim das importações. É evidente que o plano de um dos mais conhecidos panafricanistas e adeptos do comunismo a sul do Equador, falhou redondamente. A obsessão do primeiro presidente e pai da independência da República Unida da Tanzânia foi tal que mandou incendiar aldeias onde a produção não acontecia ao ritmo que tanto desejava para substituir as importações. Veja lá se quer chegar a esse ponto Sr. Presidente!
A “brilhante” ideia de ruralizar a economia nacional é o que se pode considerar uma verdadeira calamidade que vai marcar o desastre do seu mandato. Que arte esquerdista, que elevação comunista, “Sr. Presidente!
O seu programa, de tão pintado das cores vermelhas do comunismo, nem se quer conta com as estatísticas sobre a população activa maioritariamente concentrada nas zonas urbanas onde não há campos para cultivar. Por isso é que não tem como combater o desemprego gritante que aflige a juventude nas cidades, os elevados índices de criminalidade, de prostituição e nem desencorajar a roubalheira e o saque do erário público que tanto anseia pôr fim com o seu programa de combate a corrupção e a impunidade.
Só me resta aceitar que como profissional liberal que sou, sem vocação para o campo, estou marginalizado no seu plano de governação económica. Não mereço crédito para alavancar o meu negócio, não mereço facilidades para que seja um agente económico com perspectiva de crescimento, enfim. Nem mesmo a minha prima que vende água fresca em saquinhos pode augurar por um programa de micro-crédito para desenvolver o seu negócio e transformar-se numa micro-empresária. Para si, Sr. Presidente, devemos todos ir para o campo, não é assim?
Infelizmente para si, o povo anseia pela realização social e económica inspirado pelos valores da direita como são as liberdades, justiça, iniciativa privada, empreendedorismo, menos Estado e mais cidadãos e empresas, mais riqueza privada, mais realização individual. Eu faço parte desse povo, Sr, Presidente!...O povo já não quer que o Estado faça tudo, que Estado controle a satisfação das suas necessidades Sr. Presidente!
Diante desse desencontro de interesses entre o seu governo e o povo, resta-me apenas um apelo, Sr Presidente: Deixe de olhar para as cores das necessidades do povo com as lentes vermelhas do comunismo e liberte de uma vez as forças criativas da economia!

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